quinta-feira, 13 de agosto de 2009

20 anos de Jornalismo

Eu e o Edemar Araújo.

Preservando o patrimônio

Minhas historietas com os “ronca e fuça” não se acabaram naquele dia em que tirei o couro do focinho de um porquinho maleva, quando eu era um moleque morando com o tio Valdomiro. Elas se perpetuaram até os 16 anos, quando estava já na fazenda do seu Tancredo Bañolas, interior de Júlio de Castilhos, perto da cidade de Quevedos. Lá havia uma encerra com uns 8 ou 10 porcos enormes, sedentos por uma boa lavagem com farelo. Todos os dias, uma de minhas tarefas, como bom peão caseiro, era encher seus buchos.

Como era bom estar para fora! O seu Tancredo me adorava. Apesar de eu ter que trabalhar quase só pela comida, alegria não faltava. Todo mês ele visitava a fazenda para ver como o capataz Edemar Araújo, que era meu cunhado, estava cuidando o gado e o resto do seu patrimônio. Na chegada dele à estância, eu corria pegar sua égua picaça, seus apeiros e seu mango, um relho de couro que ele tinha como algo muito precioso, o qual não emprestava nem vendia para ninguém.

Num belo dia, seu Tancredo não encontrou seu mango no local onde ficavam os arreiros. Preocupado com algum ladrão, chamou o Edemar e perguntou pelo artefato. Triste, nunca quis usar outro relho, pois adorava aquele. E agora não o veria nunca mais. Passaram-se meses e, numa manhã, o Edemar e seu Tancredo andavam ao redor da fazenda e foram até a encerra de porcos.

O patrão sempre “bombeava” os bichos para ver se já era possível passar algum na xerenga e engraxar o bigode.
Lá por dentro da referida encerra, em meio aos sabugos de milho e com os porcos a roncar ali por perto, seu Tancredo quase cai ao enroscar o pé num tento que estava à flor da terra.
- Que é isso, Edemar? Parece meu mango! É ele mesmo! Mas o que faz aqui?
- Foi o João quem trouxe!
Respondeu o Edemar, num tom de quem iria me dedurar.
Após todas as surpresas, com o achado do mango quase destruído pelo barro, mais a entregada do Edemar, algo pior ainda estava por vir.
-Mas o que o João iria querer com meu mango aqui na encerra de porcos?
Mais que depressa, o Edemar me sai com esta, para terminar de vez com minha raça.
- Ah, seu Tancredo. Ele costuma surrar os porcos na hora de tratá-los.
Falou, com ar de deboche e com os olhos me procurando ali por perto.
- Mas assim os bichos não engordam!
Disse seu Tancredo, apavorado com a possível aniquilação do duplo patrimônio, seu relho e seus porcos.

E cá para nós: como é que eu iria explicar ao seu Tancredo que o seu querido relho servia para afastar aqueles malditos bichos embarrados que vinham para o meu lado na hora da bóia, não me deixando nem espalhar direito a comida nos cochos?

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